CARF afasta cobrança de IOF em fluxos financeiros entre empresas do mesmo grupo: entenda a decisão que muda o jogo

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) proferiu uma decisão relevante para grupos empresariais que realizam movimentações financeiras internas.

PAULINO, Eric.

10/25/20252 min read

No Acórdão nº 3301-014.486, o colegiado concluiu que não incide IOF sobre o mero fluxo financeiro entre empresas do mesmo grupo econômico, quando não configurado contrato de mútuo.

A decisão, proferida em 29 de julho de 2025, representa um precedente importante na discussão sobre o alcance do IOF – Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguros — especialmente nas operações de gestão de caixa e tesouraria centralizada (cash pooling).

A Empresa de Mecanização Rural Participações e Empreendimentos Imobiliários Ltda., integrante do Grupo Ferroeste, foi autuada pela Receita Federal por suposta incidência de IOF sobre movimentações financeiras entre sociedades relacionadas.

O Fisco entendeu que o contrato de “conta corrente” entre as empresas equivaleria a empréstimos (mútuos), e, portanto, estaria sujeito à tributação. O valor total da autuação superava R$ 20 milhões, incluindo principal, juros e multa de 75%.

A empresa, entretanto, sustentou que as transferências se davam dentro de um contrato formal de conta corrente, firmado desde 2010, com as seguintes características: ausência de cobrança de juros; fluxo financeiro bilateral e contínuo entre as empresas; compensação periódica de saldos; e inexistência de obrigação definitiva de restituição.

Em outras palavras: não havia um empréstimo típico, mas sim um sistema de gestão de caixa integrado entre as empresas do grupo.

O relator Conselheiro Bruno Minoru Takii destacou que o art. 13 da Lei 9.779/1999 e o art. 7º do Decreto 6.306/2007 (Regulamento do IOF) determinam a incidência do imposto sobre operações de crédito correspondentes a mútuo.

No entanto, conforme o art. 586 do Código Civil, o mútuo pressupõe: “empréstimo de coisas fungíveis, com transferência de propriedade e obrigação de restituição do mesmo gênero, qualidade e quantidade.”

O relator ainda lembrou que, segundo o art. 110 do CTN, a legislação tributária não pode alterar o conteúdo e o alcance dos institutos de direito privado. Assim, não se pode tributar como “mútuo” uma operação que juridicamente não o é.

O colegiado observou que o fluxo entre as empresas era multidirecional, com compensação contábil e controle interno, o que afasta a natureza de empréstimo.

Por maioria de votos, o CARF deu provimento ao recurso da empresa, reconhecendo a inexistência de fato gerador do IOF e afastou integralmente a cobrança fiscal.

Foram vencidos os conselheiros Márcio José Pinto Ribeiro e Paulo Guilherme Deroulede, que defendiam a tese da Fazenda Nacional.

Análise e impactos práticos

Essa decisão fortalece a tese de que o IOF não deve incidir sobre contratos de gestão de caixa entre empresas de um mesmo grupo, desde que: o contrato seja formalizado; as transferências sejam recíprocas, e não haja remuneração (juros) ou obrigação unilateral de restituição.

Na prática, o CARF reconhece a diferença entre “fluxo financeiro” e “mútuo”, o que traz segurança jurídica a operações de cash pooling e conta corrente intercompany.

⚠️ Atenção:
O precedente não significa que todas as movimentações internas estejam livres de IOF. Se houver características típicas de empréstimo —
como prazos, juros ou transferência unilateral de recursos — o tributo continuará devido.

Conclusão

O Acórdão nº 3301-014.486 (CARF, 29/07/2025) é uma vitória significativa para o meio empresarial.
Ele reforça o entendimento de que a simples circulação de recursos entre empresas relacionadas, sem intenção de mútuo, não configura operação de crédito.

Essa interpretação evita autuações injustas e contribui para um ambiente tributário mais previsível e racional — especialmente em estruturas de grupos empresariais com tesouraria centralizada.

Dr. Eric Paulino Pereira.

KPR | Kaluzny Paulino Russi Advogados Associados
Assessoria em Direito Tributário, Planejamento e Negociação Fiscal perante a PGFN e Receita Federal.